domingo, 27 de junho de 2010

Confissões de uma menina

A "menina" ficou encantada com esses três.


A justiça no futebol. Esse esporte não foi feito para ser justo; nem para ser injusto. Foi feito para, quando lhe apetecer, prejudicar uma equipe, do jeito que a bola é ciumenta. Às vezes, ela só beneficia o bom futebol. Não gosta de ser bicada para longe. Quer ser tratada com carinho, mudando de direção rapidamente, num gesto que costumamos chamar de drible. Prefere ser colocada, no cantinho, com os pés em um leve movimento que apenas as toca. Não gosta que lhe coloquem a cabeça, pois ela é amassada, e por isso que porventura vem a prejudicar quem comete esse pecado contra ela.

Era 1966. A Inglaterra, comandada por Bobby Charlton e Bobby Moore, elegantíssimos, que jogavam de cabeça erguida, jogava muito bem na Copa, sob o apoio de sua torcida. Nas semifinais, acabara de vencer a sensação do Mundial Portugal, com dois gols de Bobby Charlton. Dois golaços, de fora da área, no ângulo. Já a Alemanha havia passado pela União Soviética nas semifinais. Um futebol menos convicente. Ainda assim, a decisão era aberta, e não havia um favorito destacado. E no jogo, depois de 4 gols no tempo normal, a Inglaterra teve o gol mais polêmico da história das Copas. Hurst, recebeu, bateu, a bola bateu na trave e na linha, mas não entrou. Ainda assim, o juiz validou o gol e prejudicou a Alemanha. Justiça. Ao futebol que Charlton apresentava.

Mas depois, a Inglaterra se convenceu muito e nada fez nas Copas seguintes, apostando muito no futebol chuveirinho. Cabeçadas violentas, e a bola ficava triste outra vez com a seleção que outrora tanto lhe acariciava.

E passados 44 anos, a bola sentia mágoas da Inglaterra. E foi aprontar no dia 27 de junho de 2010. Às 10h59, quando o árbitro Jorge Larrionda deu o apito e a Alemanha saiu jogando, logo ficou evidente que ela não queria papo com a Inglaterra. No primeiro passe, Gerrard isolou a bola pela lateral.

Aos 20 minutos, a Alemanha já dominava a partida. E Neuer deu um passe, cheio de efeito, para Klose ganhar no corpo de Upson, e quando tomar a frente, bater de leve na bola. Sem machucá-la. Gol. E a bola ficou feliz, pois Klose, tão acostumado a cabecear forte, foi delicado, tocando bem de leve nela. Então continuou aprontando das suas. Alguns minutos depois, deu a dica para Klose, quando a recebeu depois de cobrança de escanteio, fazer um grande drible, deixando dois ingleses para trás. Mas como decidiu bater com as travas da chuteira, já que estava desequilibrado, a Jabulani decidiu deixar James defender.

Demonstrou o jeito que queria ser tratada aos 32 minutos da etapa inicial. Foi quando Özil passou para Klose, que voltou a utilizar uma técnica refinada pouco conhecida. Deu uma cavadinha e deixou Müller na cara do gol. Thomas deixou ela quicar, e como se não quisesse machucar a nossa redonda, deu apenas um leve toque por cima, para deixar Podolski livre. Ele a dominou sutilmente e bateu cruzado. No cantinho. 2 a 0.

Bonita e extravagante, quer ser trada com elegância.


E então a Inglaterra, cheia de raiva da menina, decidiu tentar um pouco, e a obrigou a girar, para parar na cabeça de Upson. Ele a cabeceou, contra a sua vontade. Não gostou do jeito que foi tratada. 2 a 1. Ela prometeu que se vingaria. E o fez aos 38', quando Lampard fez um toque por cobertura. Ela foi na trave, e voltou atrás da linha, porém usou todas as suas forças para empurrar-se para fora novamente. Depois, saiu toda serelepe, quando viu que Larrionda não percebeu sua malícia.

E foi parar nos pés alemães. Era dos alemães que ela gostava. Aos 7 minutos, Lampard deu uma bomba, e a bola foi parar no travessão. Coitada, se machucou. E logo ficou irada, novamente. E Müller, um de seus artistas preferidos, pegou de jeito nela para deixar Schweinsteiger no outro lado, livre. Então ele driblou um marcador, e tocou de volta para Thomas Müller. Ele bateu, e a bola foi amortecer nas redes de James. Gostou dessa ação. E se deixou solta para Özil sair em velocidade com ela e tocar fraco para Müller, que bateu cheio de jeito. Golaço. 4 a 1.

O final do jogo foi de uma leve pressão inglesa. Mas a jabulani não se deixaria levar por aqueles grossos. Fez de tudo, menos entrar no gol.



E terminado o jogo, pode-se dizer que ela deu uma lição em todos, mostrando que também é dama. Gosta de ser bem tratada. Machucada? Não. Só gosta de ser acariciada pelos pés. Que usem a cabeça, mas não batam nela com essa parte do corpo.

Ela confessou para mim, depois do jogo, que gostou muito daqueles alemães de branco. Disse que, se depender dela, eles serão os campeões. E que premia quem joga bonito.

Mas que mais adiante, também quer ver se esses argentinos são mesmo legais e gentis.

Disse que quer ver uma final entre os dois.

Veremos.

Um abraço,

Cristiano Soares.

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